22 agosto 2007

Um oásis no deserto

“Ratatouille”
Real: Brad Bird
Vozes: Patton Oswalt, Lou Romano, Janeane Garofalo, Ian Holm, Peter O'Toole
Animação, EUA, 2007, 110 min.

Remy tem um dom invulgar: consegue um olfacto apuradíssimo que lhe permite sempre escolher os melhores ingredientes para cada prato a cozinhar. Só há um senão: Remy é um rato. Perdido do seu clã e acabado de chegar às paredes do mais famoso restaurante de Paris, vai perseguir o seu sonho: tornar-se num dos maiores Chef de França.

Tornou-se lugar comum dizer que qualquer filme que saia da Pixar é um clássico instantâneo, um filme magnifíco, digno de figurar no Panteão dos Maiores de Todos os Tempos. Não sendo tão exagerado, a verdade é que o estúdio do candeeiro tem mantido um nível de qualidade impressionante durante os cerca de dez anos de trabalho que levam. Uma reputação que levou um pequeno safanão com o menos bom “Cars”, do ano passado. Não que fosse mau, mas fiquei com a impressão que passou um pouco ao lado do público.
Regresso anunciado neste ano com Ratatouille, com a recuperação do realizador Brad Bird, responsável pelo fantástico “The Incredibles”. Brad Bird tem um passado noutro nome grande da animação para adultos (sem conotações pornográficas). Foi consultor durante cerca de dez anos nos Simpsons e ajudou mesmo no desenvolvimento da série para o formato de meia hora que conhecemos agora.
Não vou descrever o prodígio técnico da animação, torna-se já redundante falar de como as personagens se mexem ou como todos os elementos parecem verdadeiros num filme da Pixar. Vou atrever-me a ir um passo mais à frente e não falar em imagens geradas por computador, mas referir a qualidade da fotografia nas cenas de exteriores, a excelente interpretação do boneco de Peter O'Toole, aqui a encarnar um crítico culinário com todos os tiques e expressões que imaginamos num crítico implacável (de qualquer área). Pode mesmo ser encarado, em conjunto com o Chef Skinner, como a vizualização perfeita do que é o vilão no Cinema. O crítico Anton Ego com o seu aspecto esguio e rodeado por uma coloração cromática mais negra e Skinner apresentando uma deficiência física, ainda que subtil: é o mais baixo de todas as personagens, envergando ambos olheiras bastante profundas. As restantes personagens são criadas de tal forma que é inevitável não sentir de imediato uma forte ligação com elas. (A isto chama-se carisma, algo que faltava no filme de que falei mais abaixo.)

Durante muito tempo foi um problema para a Pixar o aspecto das suas personagens humanas, desde o aspecto a cair para o realista de “Toy Story”. Este é um problema que parece estar mais do que ultrapassado com a afirmação do look mais cartoonesco das suas personagens, o que chega até a permitir a Linguini alguns dos momentos mais hilariantes do humor slapstick dos ultimos anos cinematográficos.

Falta referir o mais importante: o argumento, a estória, a forma como a trama é apresentada ao espectador e como este reage perante desenvolvimentos apresentados no ecrã. Também aqui Ratatouille se revela um sucesso. A estória segue o seu próprio ritmo, sem nunca se apressar para atingir determinado objectivo ou evoluir para o próximo patamar. Até a estória de amor parece surgir de forma natural, sem ser apressada ou colocada à pressão apenas para encher mais um pouco de tempo.
Sim, é um filme de animação, mas nem por isso deixa de mostrar todos os aspectos necessários para ser categorizado na estante do Cinema, com maíuscula, apresentando mesmo alguns dos planos e movimentos de câmara que já vi este Verão.

P.S. Assim que estrear um certo filme com uma certa abelha logo se verá qual dos dois é que leva para casa o troféu com o coração do público.

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